Categoria
Arquitectura, Projecto
Material
Tijolo Face à Vista
Ano
2011
Arquitecto
Arq. Tiago Reis Oliveira e Arq. Pedro Lourenço
Projecto
Reabilitação do Espaço 355
Fotografia
Pedro Afonso
Espaço do arquiteto com o Atelier 10 Dedos Valentes [Arq. Tiago Reis Oliveira e Arq. Pedro Lourenço]
Nesta edição do Espaço do arquiteto, falámos com o Atelier 10 Dedos Valentes, formado pelo Arq. Tiago Reis Oliveira e pelo Arq. Pedro Lourenço. O projecto abordado foi a Reabilitação do Espaço 355.
Apresentação do Atelier 10 Dedos Valentes [Arq. Tiago Reis Oliveira e Arq. Pedro Lourenço]
I0dedosvalentes: Tiago Reis Oliveira (Porto, 1981) e Pedro Lourenço (Porto, 1982). Diplomas em Arquitectura pela Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP). Fundadores de I0dedosvalentes, a marca distintiva de uma oficina de trabalho que privilegia, na sua metodologia e produção criativa, a interacção profícua entre arquitectura, imagem e design. Prémios e Menções: 2010| 6º Prémio no Concurso Internacional Museu do Carro Eléctrico do Porto (arquitetos pela equipa coordenada por Aurora Hernandez – Madrid). 2011| Finalistas do Prémio Nacional de Arquitectura em Madeira 2011. (Pátio Huguenot) 2012| Nomeado para o Prémio Red Dot Design Award 2012 e Finalista do World Architecture Awards 12th Cycle Shortlist. (Pátio Huguenot). I0dedosvalentes publica regularmente artigos sobre arquitectura contemporânea em revistas internacionais da especialidade. http://www.10dedosvalentes.com
Qual foi o conceito utilizado para a reabilitação do Espaço 355? Tentou reinventar o espaço, ou deu continuidade ao conceito anterior?
O espaço 355 designa a reabilitação de um espaço comercial em S. João da Madeira, localizado no piso térreo de um edifício de 1952. Um r/c amplo com uma divisão foi o ponto de partida para a operação de “resgate” de um espaço degradado com apenas 60m2, exemplar de métodos e técnicas construtivas praticamente extintas pelo seu total desuso. O estado degradado do pavimento (em cimento queimado) e a visível deterioração do revestimento das paredes (em reboco de saibro) indicaram os primeiros passos para a reabilitação. A remoção do reboco existente revelou a beleza das paredes de pedra incerta assentes sobre argamassa de saibro, elemento que confere ao espaço uma tonalidade laranja quente, que desde logo se afirmou como premissa essencial para a conquista de uma nova atmosfera para o antigo espaço comercial.
Quais foram os maiores desafios na criação deste projecto?
Quando trabalhamos sobre um espaço existente, conformado fisicamente segundo directrizes que nos são alheias e desconhecidas, o primeiro olhar avalia atentamente o conjunto de potencialidades e limitações que este oferece. O maior desafio assentou na relação espacial e material a estabelecer entre o existente e o proposto, ou seja, o cruzamento entre elementos físicos pertencentes a universos temporais distintos. Este equilíbrio entre diferentes tempos e matérias traduziu-se numa abordagem conceptual que primou por um princípio de continuidade entre as várias partes. As características físicas do espaço existente, as suas resistências, sugeriram os passos a seguir, as linhas de força da proposta: a condição elementar dos materiais conduziu à solução adoptada.
O que o levou a utilizar o Tijolo Face à Vista neste projecto?
A escolha deve-se ao cruzamento de dois objectivos concretos. O primeiro encontra-se associado à reinterpretação da técnica construtiva de sobreposição de elementos presente nas paredes existentes como elemento-chave da reabilitação, mais concretamente na construção dos novos muros que separam os espaços. O segundo procura explorar a filiação cromática com os interstícios alaranjados da parede de pedra (saibro) assim como o seu acabamento tosco, conferindo ao tijolo as propriedades perfeitas para desenvolver um diálogo harmonioso com o aspecto bruto dos materiais existentes.
Como se enquadra a utilização de Tijolo Face à Vista, na reabilitação de interiores?
O tijolo revela-se simultaneamente como um material intemporal e universal; esta condição de transversalidade no tempo e no espaço permite que a sua aplicação se adapte a qualquer tipo de contexto e circunstância, seja na reabilitação de interiores ou na simples construção de um muro exterior. Haja somente vontade e engenho capazes de potenciar o vasto leque de atmosferas e ambientes exteriores ou interiores que o tijolo tem para oferecer.
O tijolo está aplicado de uma forma não opaca. Poderia explicar qual o objectivo pretendido?
A intersecção entre o novo e o antigo procurou servir um princípio de continuidade, de modo a preservar intacta a condição singular da parede mineral existente. O tijolo de face à vista apresentou-se como elemento-chave para alcançar este novo compromisso, uma vez que se pretendeu dividir o antigo espaço amplo em três momentos distintos: hall entrada, sala 1 e sala 2, através da implantação de uma parede com 2,20 metros de altura. Este novo elemento construído configura, na ausência de contacto com as paredes existentes, os pontos de circulação entre os novos espaços. Apesar da sua implantação e altura este muro de tijolo permite, através da estereotomia pontualmente aberta, a visibilidade e a passagem de luz entre as salas e hall de entrada, invocando a anterior sensação de espaço amplo.
Porque razão optou pela continuidade do material, entre a parede e o pavimento?
A reabilitação deste pequeno espaço comercial apresenta como principal protagonista na aplicação de novas formas e materiais, o tijolo de face à vista. Desde as paredes ao pavimento, o tijolo é explorado ao máximo para se alcançar a afinada harmonia entre o existente e o proposto. Da mesma forma que a nova parede divide o espaço em três momentos distintos, também o tijolo serve para denunciar esta diferenciação no desenho dos novos pavimentos. Se a nova parede de tijolo evita o contacto com as paredes existentes, também o pavimento respeita esta premissa, sendo o tijolo crucial para a conquista desta condição. O mesmo tijolo que compõe a parede roda 90º, afastando-se 5 cm do limite das paredes existentes e também da nova parede, desenhando no pavimento o respectivo perímetro de cada espaço. O hall de entrada, a sala 1 e a sala 2 encontram-se delimitados pelo contorno de tijolo rodado a 90º, que configura a “moldura” para a aplicação do revestimento final. Estes espaços demonstram a sua diferenciação funcional através do uso de acabamentos distintos: o hall de entrada com tapete de fibra de côco, a sala 1 e a sala 2 com betonilha pigmentada a óxido de ferro e a instalação sanitária e respectiva escada de acesso com tijolo rodado a 90º.
Acha que a arquitectura actual está a mudar para uma abordagem mais sustentável?
Para a concepção do espaço, o homem lida com dois aspectos essenciais: as suas necessidades e as possibilidades que dispõe para as solucionar. As necessidades mantêm-se constantes no decorrer dos tempos sofrendo ligeiras readaptações. O que se mantém em contínua mutação são as possibilidades, técnicas e materiais, na progressiva sucessão de conquistas tecnológicas que posicionam o homem no tempo e no espaço. O problema reside na gestão do universo mutável das possibilidades com a dimensão constante das necessidades humanas. Sustentabilidade estará sempre ligada à arquitectura de boa qualidade: independentemente da época em que é feita, ou da sociedade que a concebe. O importante será procurar evitar a confusão entre o que são os meios (possibilidades) e o que sempre serão os fins (necessidades)…