Categoria

Arquitetura e Projecto

Material

Tijolo Face à Vista Vermelho Vulcânico

Ano

***

Arquitecto

Arq. Eduardo Souto Moura e da Arq. Graça Correia

Projecto

Reabilitação do Espaço Robinson⁠⁠

Fotografia

***

Espaço do arquiteto com Arq. Graça Correia

Nesta edição do Espaço do arquiteto, falámos com a Arquitecta Graça Correia, acerca do projecto Estacionamento, parte integrante do Projecto de Requalificação do Espaço Robinson, onde foi utilizado Tijolo Face à Vista. Este projecto da autoria do arquiteto Eduardo Souto Moura e da Arquitecta Graça Correia foi um dos finalistas do Prémio de Arquitectura em Tijolo de Face à Vista da Cerâmica Vale da Gândara.

Apresentação do Arq. Eduardo Souto Moura

Eduardo Souto de Moura (Portugal,1952) é arquiteto pela ESBAP desde 1980, tendo colaborado com o arquiteto Álvaro Siza Vieira de 1974 a 1979 e com o arquiteto Fernandes de Sá de 1979 a 1980. Inicia a actividade como profissional liberal em 1980, sendo autor de obras de referência mundial. Foi docente na FAUP de 1981 a 1991, tendo entretanto sido professor convidado em várias universidades designadamente Paris-Belleville, Harvard, Dublin, Zurich e Lausanne. Recebeu inúmeros prémios e distinções e participou em vários Seminários e Conferências em Portugal e no estrangeiro. Em 2011 recebe o Prémio Pritzker e em 2013 o Prémio Wolf.

Apresentação da Arq. Graça Correia

Graça Correia (Portugal 1965) estudou com Eduardo Souto de Moura na FAUP e colabora com ele de 1989 até 1995. Após ter iniciado o seu trajecto individual como arquitecta, em 2000 começa a fazer alguns projectos em co-autoria com Eduardo Souto de Moura, nomeadamente a Reabilitação do Espaço Robinson em Portalegre. Defende em 2006, na UPC, a sua Tese de Doutoramento. Cria em 2005 o escritório CORREIA/RAGAZZI arquitetoS com Roberto Ragazzi. Recebeu diversas distinções e prémios, tanto a nível nacional como internacional. Lecciona desde 1990 em várias universidades; actualmente é professora auxiliar convidada na FAUP e integra a Direcção do novo Curso de Arquitectura da Universidade Lusófona do Porto. O projecto para a Reabilitação da Área Robinson em Portalegre tem sido publicado e distinguido internacionalmente, nomeadamente com o Prémio de Reabilitação Fundación Pymecon, ex-aequo, tendo o júri destacado ” la sutil intervención realizada desde la memoria de la maquinaria industrial, y el edificio que la alberga configura el tránsito del paisaje industrial al cultural.”

Qual o conceito pensado para a reabilitação do Espaço Robinson, visto que este se situa no centro da cidade de Portalegre?

A deslocação da Fábrica da Cortiça Robinson para a Zona Industrial de Portalegre veio criar um vazio de cerca de 65.000m2 de terreno, situado numa importante área de desenvolvimento metropolitano da cidade e, ainda, uma significativa área construída, integrada na sua maioria por hangares, armazéns e oficinas. A ideia base era promover a continuidade e abertura físicas entre a cidade tradicional, a cidade contemporânea e o património industrial. Este envolvimento será essencial na definição das premissas do plano; será a criação de elementos de forte carácter urbano protagonizadas pela abertura de um novo “passeio urbano” e pela introdução de elementos como praças, passeios e equipamentos que permitirão a articulação entre os edifícios da Robinson com o tecido urbano existente, ambos dotados de forte identidade. Esta orientação permitirá ainda organizar sítios quer a norte quer a sul, o que é importante numa cidade de amplitudes térmicas da dimensão das de Portalegre. Adotou-se assim uma estratégia que pretendia recuperar a zona como espaço público e que se fundamenta no estabelecimento de vínculos entre os edifícios existentes e a cidade, bem como entre as diferentes escalas e momentos de intervenção, tentando para isso conferir-lhes carácter urbano numa atitude precedente à instalação dos novos usos para os edifícios abandonados. Pretende-se deste modo estabelecer uma relação permeável com o meio envolvente e urbano, definindo as transparências existentes ou postas em evidência pelas demolições propostas e revelando a lógica interna do conjunto para implantar nele uma configuração contemporânea em diálogo com as atividades que vai receber. Como sucede em qualquer lugar de carácter público, o projeto parte da consideração de um espaço como uma envolvente que os usuários reconfiguram constantemente, um lugar de encontros, com liberdade de uso que se metamorfoseia dependendo da atividade dos seus participantes. Este espaço converter-se-á, assim, num lugar único que se abre a todo o tipo de iniciativas culturais e artísticas, de passeio para visitantes e de estar para criadores, do qual ambos partilham e participam num debate aberto.

Quais foram os maiores desafios na criação deste projecto?

O desafio inicial e principal surge do facto de as instalações desta antiga Fábrica de cortiça se encontrarem limitadas pela própria cidade que no seu crescimento urbano acabou por envolver. Foi ainda fundamental a consideração dada ao facto de a cidade ter e estar a crescer de forma algo descaracterizada a nascente, precisamente o sentido do novo arruamento que se pretende estruturante, de nascente a poente. Este arruamento, que surge de uma espécie de caminho pré-existente, será agora fisicamente marcado pelo rasgamento de uma grande abertura na fachada do edifício principal – transformando-o numa espécie de viaduto sobre a rua. Estabelece-se assim um modelo de ocupação destinado a garantir a sobrevivência da implantação original em coabitação com as sucessivas e necessárias ampliações – o que constituía também um desafio – partindo de um princípio aditivo que ordena todo o conjunto industrial; configura-se uma nova relação com a envolvente mediante o seu cuidado desenho e a implantação estratégica dos novos edifícios da Escola de Hotelaria e Auditório para Audiovisual, contribuindo para a definição clara da rua entendida na sua forma urbana. Cada uma das peças adquirirá então sentido na sua relação com as restantes, formando um conjunto de edifícios em cuja articulação e cadência se confiará a urbanidade graças a elementos como rampas, passeios e praças. Um Plano de Requalificação Urbana, ainda que dirigido a uma zona limitada da cidade, não pode ser entendido de forma autista em relação ao seu todo, e à Zona Robinson pretendeu-se precisamente torná-la elemento estruturante da cidade, sendo para tal necessário fazer uma análise mais abrangente, quer na escala de intervenção como no tempo, o que nem sempre coincide com as vontades de resultados imediatos a que os tempos contemporâneos nos têm habituado. Esta situação, aliada à crise económica em que nos encontramos, têm-se demonstrado desafios consideráveis a um projeto que atualmente se encontra cerca de 30% construído, em modo de espera.

O parque de estacionamento aproveitando um antigo armazém tornou-se um espaço emblemático da obra, como surgiu a ideia?

Dentro do conceito subjacente à estratégia do Plano, a localização do edifício onde se instalou o Estacionamento é fundamental. A relação da estrutura existente com a rua, franca e direta, e o facto de ser uma área ampla, bem iluminada e naturalmente ventilada, tornou-a ideal para se transformar num parque de estacionamento, evitando a construção de uma estrutura de raiz com elevados custos. Dada a sua proximidade à Escola de Hotelaria e às outras unidades de ensino como o Conservatório de Música, a Escola de Ballet e a Oficina de Expressões Artísticas, onde se prevê uma grande população jovem, esta estrutura foi também dotada para a realização de eventos quer sejam concertos ou mesmo festas populares, que têm vindo a ocorrer.

No âmbito da regeneração urbana, como perspetiva o reaproveitamento de espaços devolutos nas cidades para novas utilizações?

Conservar a memória histórica através do seu património construído é alimentar os sinais de identidade de uma cidade que não quer ver anulado o seu papel no panorama do país. Mediante a sua adaptação a novos usos, os edifícios ‘contentores’ do passado configuram novos cenários numa cidade secular que se quer aberta ao futuro. Hoje em dia, no entanto, a noção de património estendeu-se largamente desde os achados pré-históricos até aos edifícios do séc. XX, incluindo as ambiências de valor histórico e ambiental desde a arquitectura vernácula até à arquitectura industrial, mais ou menos erudita. Assim, torna-se necessário intervir nos traçados legados pelo património industrial, como estruturas utilitárias deste século. Esta ideia está imersa num processo de renovação que segue a tendência de recuperação de espaços industriais generalizada na Europa e Estados Unidos nos últimos anos. Vários edifícios devolutos estão disponíveis para albergar novos programas e funções, estes não têm necessariamente de estar destinados a transmitir ideias ou valores únicos para a posterioridade. Contudo, esta alteração, ou reaproveitamento, como refere, tem de ser consciente da história, não apenas a emotiva, relacionada com as atividades desenvolvidas ou os seus moradores, mas a dos factos, que se relaciona com a sua história, a sua realidade construtiva. Ou seja, não basta manter uma fachada como se este fosse o único elemento relevante de um edifício, por ser o visível, negando a sua lógica construtiva que tem um lugar de grande importância, também, na história da evolução da cidade.

Qual o papel que o tijolo face à vista, como elemento modular pode tomar na reabilitação e na reinvenção de espaços?

O tijolo face à vista pode desempenhar um papel importante. Quer na reabilitação como na construção de raiz deve ser entendido como um elemento de características particulares e que podem e devem ser exploradas. Como referia Mies van der Rohe, “cada material é aquilo que fazemos dele”.